24 de maio de 2009

À lei da bomba suja

Não tenho competência para avaliar o conteúdo dos recados do bastonário dos advogados, embora saiba que não aprecio o estilo. Acho muito bem que alguns temas provoquem terramotos, mas abomino a lei da bomba. A lei da bomba implica sempre que o próprio conteúdo fique estilhaçado pela explosão e pelas ondas de choque. Tudo aquilo encerra algo de suicidário.

Já em relação à Moura Guedes, a coisa muda de figura porque, na minha opinião, é incomparavelmente mais grave. A Moura Guedes é a boca armada de uma estratégia comum, muito maior que o simples ataque ao governo. Moniz pegou no 4º canal com a noção clara de que não conseguiria competir com a SIC, no território em que a SIC se posicionou. Para obter poder (influência e dinheiro) restavam-lhe duas hipóteses: a excelência ou o primarismo rasca. Percebeu imediatamente que a primeira opção era utópica. Ainda que o soubesse fazer, trabalharia para um pequeno nicho de mercado. Ao fim de 500 anos, se o país acordasse do coma genético poderia, talvez, sonhar em atingir os seus objectivos. A segunda opção estava conquistada à partida. Se fosse suficientemente bidimensional, se substituísse pessoas por imagens de cartão e cidades por cenários de fachada, se clivasse o mundo em bons e maus apelando, qual Pavlov em Queluz, à boçalidade sempre pronta a despontar, conquistaria tudo.

Assim foi. Desde o início do mandato, certificou-se de que conseguiria fidelizar os apoucados e resgatar as almas perdidas, que deambulavam no sangue que a SIC lhes oferecia, embora o tenham sempre considerado excessivamente estilizado. Modernices. A TVI ofereceu, então, o encaixe perfeito: touradas, exploração da intimidade, emoções básicas, religião, péssimo grafismo, cenários medíocres e actividades erótico-festivas. A coisa resultou tão bem que até assustou a SIC. O que a safou (a SIC safou-se?...) foi ter levado uma abada nos territórios bárbaros e, apesar disso, a estação de Carnaxide ainda fez uns brilharetes a chafurdar na merda. Mas a TVI já era indiscutível e estava instaladíssima onde haveria de ficar.

A informação (lol) é o corolário, nesta estratégia da pocilga. Moura Guedes concentra-se no registo mais execrável que lhe for possível, agarrada à convicção de que as pessoas às quais se dirige, mesmo que sejam um bocadinho melhores que aquilo, depressa se rendem a um bom regabofe de imbecilidade justiceira. Tem-lhe corrido bem, o país dela parece achar que não merece melhor.

Finalizando...

"(...) tudo o que for um arremedo de oposição ao governo, por estes dias, parece-me bem. Saudável, pelo menos. Cada um joga com as armas que tem, e as de quem está no poder num determinado momento são sempre poderosas, por isso que venha o contraditório, sob que forma for."

Não sei se a autora pretendeu demarcar-se de um certo lip service, mas o post agora em causa não passa de um elogio à lei da bomba suja, no sentido em que MMG não é minimamente cirúrgica (ao contrário do que possa parecer). E as baixas indiscriminadas, mesmo pensando que o Marinho Pinto atinge o país ao atingir o sistema de Justiça (na verdade, todo o sistema de Justiça se atinge constantemente a si próprio), as baixas são incomparavelmente mais graves do que no caso do bastonário. O noticiário tem uma imensa exposição e é diário, ano após ano.

Explico-me: mesmo que as bocas da Guedes tenham o nome dos alvos aos quais se dirigem, são tão boçais e estupidificantes que acabam por nos atingir a todos, incluindo os que não a vêem. Atingem-nos a inteligência, o pensamento crítico e destroem uma noção que, a meu ver, é das mais importantes na arte do tal contraditório: a lealdade para com os inimigos. Se a expressão "lealdade" chocar, eu reformulo: jogo limpo. Ingenuidade à parte, é assim que um povo cresce. No exercício da argumentação.

[img] Ric Stultz